terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Capítulo I – Surra 19/02/2013


Atacar por trás é covardia... E daí? Quem liga para isso? Ninguém às 4:48 da madrugada de terça-feira, quando se está cambaleando por um beco imundo e fedido portando uma garrafa de “Old Eight” vazia e melada. O golpe veio seco, nas costelas! O suficiente para me derrubar em cima de um monte de lixo... Bater em bêbado é uma covardia maior ainda do que atacar por trás... Mas quem liga para isso? Ninguém. Não quando você é um vagabundo, não esta noite. Depois do terceiro chute na cabeça tudo ficou mais confortável, parei de ouvir. Virou-me de barriga para cima com um chute nas costelas. Tentei ver o rosto do meu algoz, cerrei os olhos e cheguei à conclusão de que era um completo estranho.

Sorrateiramente deslizou sua mão para dentro de meu casaco e sacou minha carteira... Tratava-se de um amador. O cara fez uma puta lambança só por causa da carteira vazia de um bêbado? Não havia um centavo, apenas notas de bares e supermercados que denunciavam minhas práticas alcoólicas dos últimos meses. Acho que isso deixou nosso aspirante a larápio mais puto ainda, começou a fuçar em todos os bolsos me amaldiçoando no que deveriam ser palavrões e xingamentos homéricos, ainda bem que eu permanecia surdo e quase morto. Acredite, uma garrafa de uísque ruim faz certas dores parecerem carícias delicadas.

Por fim, nosso gênio concluiu que daquela pedra não sairia leite, nem uísque, nem nada. Desferiu duas pisadas em minha barriga me forçando a virar de lado. Abriu o zíper de sua calça e fez questão de mirar seu flácido membro no que restara de minha face. Mijou em abundância, literalmente me afogando naquela mixórdia de sangue, saliva, suor e amônia! Jogou minha carteira na poça de mijo perto do meu rosto, deu as costas e saiu meio correndo, meio andando... Amador demais.

Quando abri os olhos novamente já era dia... Demorou uma eternidade para eu conseguir mexer um dedo, outra para mexer o braço e assim por diante. Consegui ficar de quatro depois de uns vinte minutos creio eu. Criei coragem e em um súbito desvario atirei meu corpo contra a parede buscando apoio para me escorar... Fui literalmente escorrendo para cima até me colocar de pé. Só neste momento que minha cabeça fez questão de me lembrar do porre de “Old eight” (e olha que para demorar mais do que três segundos para sentir uma ressaca dessas requer estar muito fodido). Foi tiro e queda, a dor irrompeu, a náusea castigou e o vômito colaborou com minha volta ao solo... Vamos lá, tudo de novo.

Mais uns quinze minutos e lá estava eu de pé novamente... O corpo parecia atropelado por um trator, a cabeça parecia abrigar todos os ferrados pelas guerras desde a antiguidade, o espirito... Bem que espirito? Pé ante pé, fui rastejando para fora do beco no intuito de avistar meu saudoso e seguro “Friends n’ Chips” novamente... Missão cumprida e comprida. Lá fui eu porta adentro e os pedreiros e cobradores já encaravam comerciais e pf’s fedendo a sebo... Nesse instante que o Almeida esbravejou:

- Porra Carcamano, nem meio-dia direito ainda e você já me aparece por aqui todo fodido, fedendo a cú de defunto e com essa cara estropiada???!!! Vai se foder!!!
- Caralho Almeida, vê se não me enche as bolas e me vê um duplo, com bastante gelo! E que porra de comida é essa que fede mais do que eu?
- Cala boca seu veado, senta lá no canto do balcão que já te sirvo, vai comer algo?
- Só seu estivesse demente da cabeça!!!

Ao me sentar no banco pegado ao balcão, tirei um dos sapatos e resgatei de dentro da meia uma nota de dez. Eles podem me surrar e me emporcalhar o quanto quiserem, mas sempre haverá dinheiro para mais uma dose...

- Porra Carcamano, vê se te emenda caralho! Vai trabalhar, faz alguma coisa que preste dessa vida!!!
- Como o que? Limpar a latrina dessa espelunca aqui?
- Vai te foder seu merda! Bebe logo essa porra e vaza daqui antes que eu mesmo quebre mais a sua cara!
- Almeida, é o seguinte cara, quanto mais a vida continuar me surrando, mais eu vou continuar fodendo ela até chegarmos a um acordo, ou não!
- AHAHAHA!!! Você não passa de um bosta mesmo, some logo daqui, vê se dorme um pouco e se prepara porque a noite vai rolar um esquema lá no Vandré.
- Demorou... Ciao!!!


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